quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Pérolas da Infância

Quando a areia entra na ostra, causa-lhe um desconforto que provoca uma reação que resulta na formação de uma pérola. A areia:
- Me deixa viver a minha vida em paz!

Quem ouve esta frase de um adolescente, pensará em sua necessidade de auto-afirmação e desenvolvimento pessoal. Achará que ele está reivindicando seu espaço no mundo e sua liberdade de tomar suas próprias decisões.
Muitos diriam que o adolescente está na famosa fase da rebeldia, onde contesta a tudo e a todos.
Muitos adolescentes já devem ter dito algo parecido, mas a frase acima foi proferida por uma criança de 7 anos!
Deixe-me contextualizar a ocasião: eu estava secando o cabelo da minha filha, quando observei seu velho hábito de respirar de boca aberta. Sabendo que isto é prejudicial à saúde, disse-lhe que fechasse a boca. Eis que ouvi a declaração acima de sua boca infantil.
Confesso que minha reação inicial foi de mostrar a minha autoridade, onde disse em alto e bom som que sendo o adulto responsável exigia obediência, mesmo porque eu estava fazendo algo para o bem dela.
Após longo choro por parte dela e, eu já capaz de construir uma argumentação mais elucidativa, parti para o diálogo:
- Minha mãe paga as minhas contas?
- Não.
- Cuida da minha casa?
- Não.
- Faz minha comida?
- Não.
- Cuida de mim e decide o que é bom ou não para mim?
- Não.
- Então eu posso viver minha vida como quero porque não dependo mais dela. E você, paga as suas contas?
- Não.
- Cuida da sua casa?
- Não.
- Faz sua comida?
- Não.
- Cuida de você?
- Não.
- E você acha que é capaz de decidir o que é bom ou ruim para você?
- Não.
- Então eu não posso deixar você viver sua vida em paz. Você precisa de mim. Vou ensinar você a se tornar uma pessoa independente, para que um dia você possa viver sua vida ao seu modo. Mas até lá, você tem que fazer as coisas da minha maneira. Sempre poderemos conversar. Você sempre poderá me dizer se prefere que alguma coisa seja deste jeito ou de outro. Mas quando um assunto precisar de uma palavra final, será a minha.
Ela explicou que achava que eu mandaria e decidiria por ela para sempre e que era isto o que a estava incomodando. Depois de perceber que os anos que passaria comigo seriam numericamente inferiores aos de sua vida adulta, chegou a conclusão de que era melhor aproveitar o tempo que passaria ao meu lado.
Nos abraçamos e, da areia, surgiu a pérola.

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